sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Conhece a síndrome da abstinência do exercício

Com reações semelhantes às da síndrome da abstinência de drogas, ela pode levar a alteração de humor, desânimo e até depressão

Ter baixa de energia, sentir-se triste ou deprimido, ficar irritado ou mal humorado, ignorar as ordens médicas. Mais do que contrariedade, teimosia ou inconsequência por parte do esportista, estes comportamentos podem ser sintomas da síndrome da abstinência dos exercícios.

As sensações desagradáveis relacionadas à privação de alguns dias de treino parecem ser similares à síndrome de abstinência causada pelas drogas. “Elas possivelmente estão relacionadas à produção e dependência dos opióides endógenos (encefalinas e endorfinas)”, diz Altair Argentino Pereira Júnior, mestre em Ciências do Movimento Humano pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e docente do Centro Universitário de Brusque (Unifebe).

O coordenador de manutenção Augusto de Barros Guimarães, 39 anos, de Belo Horizonte, sempre teve problemas para dormir, a ponto de receber prescrição médica de remédios para pegar no sono.

Até que, em 2008, a corrida entrou em sua vida. “Foi uma maravilha. Em pouco tempo eu reduzi as doses dos medicamentos e depois zerei a necessidade dos comprimidos”, conta.

Entusiasmado e por conta própria, passou a correr 10 quilômetros por dia, de domingo a domingo – carga excessiva para um iniciante.

Até que o corpo apitou, com uma fratura por estresse na tíbia. Resultado: Augusto teve de parar completamente com a atividade física por dois meses. “Não era só o bem-estar físico, tinha o emocional também. Encarar essa parada forçada foi bem difícil. Em 10 dias já estava pedindo para voltar com os remédios para dormir”. A ansiedade também foi às alturas e ele chegou a se sentir deprimido e sem energia para realizar as atividades cotidianas.

Em seu retorno ao esporte, queria recuperar o tempo perdido. Ele compara: “Todo ano, no período da quaresma, fico 40 dias sem comer carne. Sinto falta, mas em poucos dias me acostumo. Quando volto a comer carne, me contento com porções menores. Com a corrida não foi assim. Retornei buscando ir mais longe e mais rápido”. Este novo abuso o levou a uma segunda lesão, seis meses depois.

Com diagnóstico de tendinite patelar, teria de ficar mais 30 dias de molho. Mas Augusto não parou. “Peguei mais leve, mas não interrompi a atividade física. Fiquei com medo de voltar ao estágio inicial dos remédios para dormir”, conta o corredor.

No caso do gerente de serviços de tecnologia Leandro Turbino, de 32 anos, de São Paulo, foi a vida profissional que o afastou do esporte. “Estava praticando atividade física há dois anos, constantemente. Mudei de função no trabalho, minha rotina se alterou e não consegui mais treinar. Uma semana depois já notava alteração de humor e baixa de energia”, conta.

Uma coisa levou à outra e agora ele luta contra a falta de disposição até para ações diárias, como brincar com as filhas ou aguentar o ritmo intenso no escritório. “Sinto falta do bem-estar que o exercício proporciona”.

Pesquisas apontam que alguns corredores apresentam sintomas de abstinência, tais como irritabilidade, ansiedade, depressão e sentimentos de culpa quando impedidos de participar de suas rotinas de corridas regulares. Em alguns casos, a coisa pode se agravar pela dependência ao próprio exercício.

“A prática regular de atividade física pode produzir vários efeitos benéficos à saúde, mas estudos indicam que, quando são realizadas de maneira compulsiva, podem resultar em dependência patológica”, alerta o professor Altair. E uma vez dependentes, esses indivíduos ficam vulneráveis ao quadro da síndrome do excesso de treinamento (SET).

O círculo vicioso está armado: a dependência pode levar ao aumento de carga e à prática intensiva de exercícios que por sua vez podem levar a lesões e à interrupção da atividade, gerando distúrbios de humor, indisposição, depressão.

“É preocupante ver algumas pessoas que, obrigadas a parar por algum motivo – lesão, viagem, falta de tempo –, acham que o mundo vai acabar. Cabe a nós, profissionais, ficarmos atentos e chamar a atenção em caso de necessidade” afirma o professor de educação física e personal trainer Leonardo Barbosa, da Reebok Sport Club, de São Paulo.

Atletas de todos os níveis de performance correm o risco de sofrer da síndrome do excesso de treinamento. Mas são considerados altamente suscetíveis ao desenvolvimento do quadro: indivíduos muito motivados, atletas de alto rendimento, pessoas que retornam precocemente aos treinos (antes de estarem completamente recuperadas de suas lesões), atletas e não atletas auto-treinados e pessoas com orientação técnica não qualificada.

O que fazer

“Por mais que a atividade física seja prazerosa, é importante entender que ela é apenas uma parte da vida. Pode até ter um grau de importância alto para você, mas não a ponto de torná-lo dependente”, alerta o psicólogo do esporte José Anibal Azevedo Marques, da Interação Psicologia e Esporte, de São Paulo.

Em caso de parada por orientação médica, respeite o período proposto para a recuperação. Se o problema for falta de tempo na agenda, tente marcar um determinado dia para a volta. Trace um plano gradual para o retorno e trabalhe sua determinação para cumprir o compromisso com você mesmo. “Nada está perdido. Não vão ser duas ou três semanas de afastamento que irão acabar com sua vida atlética”, reforça Leonardo Barbosa.

Para compensar o fato de não poder praticar sua atividade preferida momentaneamente, vale buscar alternativas: desde técnicas de relaxamento até outros exercícios que possam ser executados sem agravar possíveis lesões existentes.

“Se você machucou o joelho, por exemplo, procure trabalhar os membros superiores”, sugere o professor Leonardo.

A tradutora e intérprete de mandarim e inglês Venuza Ho, de 26 anos, de São Paulo, soube lidar bem com sua parada obrigatória. Acostumada a correr com frequência nos últimos quatro anos, ela ficou impossibilitada de praticar a atividade por dois meses devido a uma pequena lesão após a Maratona do Rio de Janeiro, em julho. “Fiquei triste, mas sabia que era temporário. Aproveitei a oportunidade para focar em outras coisas, como estudar para um novo vestibular. Para não ficar parada completamente, fui pedalar”, diz. Aliviada por não sentir mais dores, ela já retomou os treinos e programa uma nova prova de longa distância – mas somente para o ano que vem.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O jeito de encarar a corrida é o segredo do bom rendimento


Cada vez mais o conceito de sustentabilidade deve ser aplicado aos nossos hábitos e tarefas diárias. Dentro do mundo da corrida a idéia de sustentável tem mais um sentido, o de manter de forma contínua e segura sua frequência e melhora de rendimento.
É muito comum encontrarmos pessoas que iniciaram um programa de treinamento para corrida e por algum motivo não alcançaram o objetivo estabelecido inicialmente, seja ele um determinado desempenho ou mesmo o ganho de saúde e qualidade de vida.
Está na maneira como encaramos a corrida o segredo para torná-la sustentável, ou seja, não podemos encarar o treino como um remédio que estamos tomando para resolver determinado problema, seja ele de saúde ou puro estresse.
Assim que sentimos as primeiras melhoras, resultado das alterações fisiológicas ao esforço, temos a tendência de pensar que o problema inicial está resolvido, e como com qualquer medicamento paramos de tomar. É neste ponto que a postura sustentável do corredor deve prevalecer, são elas:
- O corredor sustentável deve sempre pensar que a fase inicial de treino será a base para sua evolução segura e contínua. Esta adaptação deve ser feita com muito cuidado e coerência, principalmente na relação do volume e da intensidade dos treinos.
- O acompanhamento profissional qualificado é a maneira mais indicada para se formular um planejamento de treino que respeite suas necessidades individuais e desta forma possibilite que a prática da corrida se torne uma atividade de longo prazo.
- A proteção articular, adquirida com o fortalecimento muscular direcionado, é um dos maiores aliados na segurança do corredor. Com as articulações bem protegidas pela musculatura trabalhada de forma correta, este indivíduo terá condições de evoluir na intensidade e no volume do seu treino de forma gradativa.
- A corrida deve ser incorporada como mais uma atividade de sua rotina. Depois que este hábito estiver adaptado aos seus horários a falta de tempo não será mais motivo para deixar de treinar.
O cidadão com postura sustentável se preocupa com o destino do seu lixo, procura reciclar papel, latas e embalagens, economiza água e energia elétrica além de procurar empresas que fornecem bens e serviços com a mesma postura. Ser sustentável requer esforço, disciplina, consciência e acima de tudo força de vontade. Devemos ser assim como cidadãos e também como corredores!

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Parada obrigatória


Quando surge uma lesão, mais do que tempo para a recuperação física, é preciso treinar a resistência psicológica e não se deixar abater.
Tudo estava indo bem. Você evoluindo no treinamento, conseguindo baixar seus tempos em provas, participando de grandes desafios, traçando metas ainda maiores. Eis que de repente uma dorzinha começa a incomodar. Embriagado pela sensação de poder e superação, você não liga para o sinal e continua em ritmo intenso. A dor aumenta, passa a comprometer a performance e até o humor e a única saída, então, é procurar um médico. Diante do especialista você ouve algo como "vamos realizar alguns exames e enquanto isso vai ter que parar de correr". Você tenta argumentar que o incômodo não é tão grande, que é possível aguentar, que tem uma corrida no final de semana... Mas não tem jeito: o diagnóstico aponta uma lesão e você é obrigado a parar. Sim, é duro sair de cena no melhor da festa. Só que se você não der esse tempo, o problema certamente vai piorar e comprometer ainda mais sua vida. Mas como enfrentar os dias, semanas e por vezes meses longe dos tênis de corrida? Mais do que a própria recuperação física, é preciso ter apoio para não se deixar abalar pelo psicológico.
A primeira grande dificuldade do atleta lesionado é aceitar que está machucado. "Ele passa por diferentes fases durante a lesão: a primeira está relacionada à negação e acontece quando o corredor não dá valor para a dor que sente, negando que o corpo está lhe colocando um limite físico. Em um segundo momento, ele se dá conta de que está machucado e geralmente fica com muita raiva", diz Carla Di Pierro, psicóloga do esporte do Instituto Vita, de São Paulo.
A mistura de sentimentos e a interrupção repentina na atividade física mexem com a pessoa e ocorrem inclusive alterações na produção de endorfina e serotonina. "São reações químicas e psicológicas. Pode aparecer uma espécie de síndrome de abstinência, quando o corredor experimenta estados de nervosismo, angústia e até depressão", afirma Rogério Teixeira da Silva, ortopedista e especialista em medicina esportiva, coordenador do NEO - Núcleo de Estudos em Esportes e Ortopedia, de São Paulo. Há casos até em que o corredor controlava um quadro depressivo com atividade física e, com a lesão, é obrigado a voltar para os remédios.
As lesões costumam ser um problema para o atleta amador porque pressupõem perdas esportivas, físicas e psíquicas, relacionadas a limite, fracasso e frustração. "Além da perda imediata e futura de rendimento, devido à interrupção, o tempo ocioso antes ocupado pela corrida traz a sensação de queda de performance, ganho de peso, e a pessoa não se vê mais capacitada a realizar o que antes fazia com facilidade", analisa Carla.
Em um terceiro momento, quando ‘cai a ficha', o corredor percebe que precisará tomar algumas ações para melhorar sua situação: é etapa da negociação, ou seja, de rever os treinos, estabelecer novas metas, programar novas atividades. Se este momento é bem elaborado, ele parte para a aceitação e reorganiza a vida, a fim de voltar logo e inteiro para os treinos "Agora, se ele começa a se ver como lesionado e incapaz, existe a possibilidade de ficar mais inquieto, sentir-se perdendo a identidade de atleta e excluído do grupo de corrida - e entra em cena a fase da depressão", diz a psicóloga do esporte.
O problema é fixar-se nessa etapa, sentindo-se despersonificado, com medo, ansioso e daí passar a ter comportamentos desajustados, como obsessão pelo retorno ao esporte, retorno precoce associado à lesão reincidente, reclamações exageradas e alterações rápidas de humor. "Ele vive a culpa e o pessimismo, o que não ajuda no seu humor e na sua motivação para recuperação. O importante é estar atento para cada uma das fases, perceber-se passando por elas e superando-as. Na etapa depressiva, quando reina o pessimismo, é importante questionar estes pensamentos e comportamentos, e procurar basear-se em evidências realistas de que é possível se recuperar", recomenda Carla Di Pierro.
Para ajudar a aliviar suas angústias, ouça seu médico, seu fisioterapeuta, seu técnico e valorize suas palavras. Entenda sobre sua lesão, suas possíveis causas, seu tratamento e que cuidados terá que tomar dali em diante. Procure exemplos próximos de reabilitações bem sucedidas e encare o trabalho da reabilitação. "Em alguns casos será importante ainda a participação de um psicólogo do esporte e até a administração de antidepressivos", diz Rogério Teixeira